Especialista em Direito Médico esclarece autonomia do paciente, cuidados paliativos e direito a tratamentos no exterior em casos graves

Por Karol Peralta
A recente morte da cantora Preta Gil, aos 50 anos, vítima de um câncer no intestino, trouxe à tona um tema delicado e fundamental no debate sobre saúde: até que ponto a medicina pode e deve ir quando os tratamentos convencionais se esgotam?
Diagnosticada em 2023, Preta Gil passou por tratamentos no Brasil e buscou, ainda, alternativas no exterior, incluindo os Estados Unidos. Esse percurso levanta questões importantes sobre o direito do paciente de buscar tratamentos experimentais ou não disponíveis no país, o papel dos cuidados paliativos e a responsabilidade do Sistema Único de Saúde (SUS) e planos privados de saúde.
Segundo Stephanie Canale, advogada especialista em Direito Médico, a Constituição Federal assegura a todos o direito à saúde, o que inclui a liberdade de procurar tratamentos fora do país quando não existam opções viáveis no Brasil. “Há precedentes judiciais que obrigam o SUS e os planos de saúde a custearem esses tratamentos, especialmente em casos de urgência e mediante laudo médico que comprove a necessidade”, afirma.
No entanto, a especialista ressalta que, quando os tratamentos não apresentam mais resultados, o foco deve mudar para os cuidados paliativos. “Eles não representam abandono do paciente, mas sim a garantia de dignidade, conforto e atenção integral ao sofrimento”, explica. Esses cuidados envolvem a ortotanásia, o permitir da morte natural, sem intervenções artificiais desnecessárias, prática que é legal e aceita pelo Conselho Federal de Medicina.
O contrário, chamado distanásia, ocorre quando há a manutenção de tratamentos fúteis que prolongam o sofrimento sem perspectivas de cura. “Prolongar o tratamento sem benefícios reais não é ético”, destaca Canale.
Outro ponto fundamental é o respeito à autonomia do paciente. Stephanie Canale frisa que a decisão sobre até onde deseja ir em tratamentos deve ser respeitada, seja optar por continuar tentando todas as possibilidades, seja por priorizar o alívio da dor e a qualidade de vida nos últimos momentos.
Stephanie Miola Canale Brown é advogada especializada em Direito Médico e Hospitalar, professora e mestranda na área, com ampla experiência em responsabilidade civil, judicialização da saúde e bioética. Fundadora do seu próprio escritório, atua na assessoria jurídica para profissionais e instituições de saúde, sendo referência para temas complexos na interface entre direito e medicina.
O caso de Preta Gil reacende a reflexão sobre os direitos do paciente, os limites da medicina e a importância do diálogo aberto entre médicos, pacientes e familiares diante da finitude da vida.
