Falta de centros especializados para aplicação de medicamentos imunobiológicos coloca em risco tratamento de doenças crônicas e raras no Brasil

Por Karol Peralta
Desde 2003, Fernando Henrique dos Santos, 42 anos, sofre com dores intensas na coluna. Inicialmente diagnosticado com artrite reumatoide em 2018, Santos foi afastado do trabalho. Recentemente, seu diagnóstico foi alterado para espondilite anquilosante, uma forma de artrite inflamatória que atinge principalmente a coluna vertebral.
O tratamento de Santos depende do medicamento infliximabe, aplicado a cada oito semanas por infusão, de alto custo. Embora o remédio seja fornecido gratuitamente pelo SUS, Santos precisou se deslocar de Guarulhos a Mogi das Cruzes para receber a aplicação, que exigia equipe especializada. Quando o contrato entre o laboratório fabricante e o governo estadual foi encerrado, o paciente teve de recorrer a uma clínica privada por meio de convênio médico.
“Eu estou afastado do serviço, então posso me deslocar entre Guarulhos e a capital. Mas minha maior dificuldade é o tratamento em si: pelo SUS não consigo fazer a aplicação”, contou Santos.
A Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR) alerta que a falta de centros de infusão no SUS e protocolos claros para aplicação de medicamentos imunobiológicos coloca em risco a saúde de pacientes com doenças crônicas e raras.
Durante o Congresso Brasileiro de Reumatologia, o reumatologista Vander Fernandes, coordenador da Comissão de Centros de Terapia Assistida, explicou que o SUS fornece muitos medicamentos gratuitamente, mas não há estrutura adequada para administrá-los de forma segura.
“Alguns medicamentos exigem infusão longa, pré-medicação e atenção a possíveis reações adversas. Sem centros especializados, há risco de perda de eficácia e segurança do tratamento”, afirmou Fernandes.
Além disso, o armazenamento correto é crucial, pois medicamentos de biotecnologia podem perder a eficácia fora das condições adequadas de temperatura.
Atualmente, o Brasil conta com apenas 61 centros de terapia assistida, a maioria privada e concentrada no Sudeste. Apenas 11 têm contrato com o SUS, e cerca de 20 mil pacientes dependem desses serviços para medicamentos imunobiológicos administrados por infusão endovenosa.
Uma pesquisa da Biored Brasil, de julho de 2023, com 761 pacientes do SUS revelou que 10% não tinham acesso à aplicação do medicamento e 46% não encontravam centro de terapia assistida próximo de casa. Mais da metade dos entrevistados (55%) pagavam entre R$ 150 e R$ 200 por aplicação, impactando significativamente a renda familiar.
Somente 20% dos pacientes realizam a aplicação em centros do SUS. O Ministério da Saúde informou que está analisando a criação de pontos que possam se tornar centros de terapia assistida, mas o processo ainda se encontra em fase de estudos técnicos.
“Tem pessoas que estão com remédio na mão e não têm onde fazer a aplicação. Isso não tem cabimento”, reforçou Fernandes.
O caso de Fernando Henrique dos Santos evidencia a necessidade urgente de centros de terapia assistida acessíveis em todas as regiões, garantindo a aplicação segura e eficaz de medicamentos de alto custo e protegendo a saúde de pacientes com doenças crônicas autoimunes.





