A Operação Contenção mobilizou 2,5 mil agentes nos complexos da Penha e do Alemão, interrompeu serviços essenciais e é apontada por especialistas como “lambança político-operacional” que amplia a violência no estado

Por Karol Peralta
Um dia de terror marcou a vida de mais de 150 mil moradores dos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro, nesta terça-feira (28). A Operação Contenção, considerada a maior e mais letal dos últimos 15 anos, deixou 64 mortos, entre eles quatro policiais, além de 81 presos e 93 fuzis apreendidos. A ação paralisou a capital fluminense, com escolas, postos de saúde e comércios fechados, e bloqueou as principais vias da cidade.
Segundo o governo estadual, o objetivo era conter o avanço territorial do Comando Vermelho e cumprir mandados de prisão. No entanto, especialistas em segurança pública afirmam que a operação foi mal planejada e teve efeito contrário ao esperado, ampliando a insegurança e o sofrimento da população.
O professor José Cláudio Souza Alves, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), avaliou que ações desse tipo fortalecem a violência.
“Essa lógica de medir força bélica com o tráfico sempre resultou em mortes maiores, em sofrimento intenso, perda de acesso a serviços e de mobilidade. A economia é afetada diretamente e o problema nunca é resolvido”, afirmou.
Para o pesquisador, combater o crime organizado exige estratégias estruturais e políticas públicas duradouras, e não operações pontuais.
“É preciso disputar esses territórios oferecendo alternativas reais, educação, emprego e qualidade de vida. Sem isso, continuaremos comprometidos”, completou.
“Lambança político-operacional”, dizem especialistas
A professora Jacqueline Muniz, do Departamento de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF), classificou a Operação Contenção como uma “lambança político-operacional”. Em entrevista à Rádio Nacional do Rio, ela afirmou que o planejamento contrariou as normas básicas de segurança pública.
“Para colocar 2,5 mil policiais em campo, seria necessário prever de 7,5 mil a 10 mil agentes, considerando turnos e escalas. Isso significa que, para realizar essa operação, o governo retirou policiamento de até 5 milhões de pessoas na região metropolitana”, destacou.
Ela acrescentou que a ação não reduziu a capacidade operacional do crime organizado, mas aumentou os riscos para policiais e civis.
“Fechar vias como a Linha Vermelha, Linha Amarela e Avenida Brasil é inviabilizar a circulação de pessoas e mercadorias. O resultado foi multiplicar a insegurança”, afirmou Muniz.
Segundo a professora, embora houvesse justificativa para a operação, a execução foi mal concebida e politicamente motivada.
“A finalidade dela foi politiqueira, pondo em risco vidas e violando critérios técnicos. Polícia é profissão, não amadorismo”, concluiu.
Expansão do Comando Vermelho e crise na segurança pública
De acordo com o governo estadual, a operação teve como meta conter o avanço do Comando Vermelho, facção que ampliou seu domínio no Grande Rio em 8,4% entre 2022 e 2023, segundo pesquisa do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (GENI/UFF) e do Instituto Fogo Cruzado.
O levantamento aponta que a facção passou a controlar 51,9% das áreas dominadas por grupos criminosos, ultrapassando as milícias e retomando territórios perdidos em 2021.
Entretanto, para o Instituto Fogo Cruzado, ações como a Operação Contenção não combatem o crime organizado de forma eficaz.
“Combater o crime exige atacar fluxos financeiros, investigar lavagem de dinheiro e fortalecer corregedorias. Operações desse tipo apenas colocam a população na linha de tiro”, afirmou a entidade.
O instituto também destacou que a ação se tornou a maior chacina policial da história do Rio de Janeiro, superando as tragédias do Jacarezinho (2021) e da Vila Cruzeiro (2022), ambas realizadas durante o governo de Cláudio Castro.





